Por brincadeira, como nunca houve uma eleição em que não votasse, costuma dizer que aos 35 anos podia candidatar-se a Presidente da República. Nas próximas eleições presidenciais Vasco Durão, nascido em 1972, se assim o desejar, já pode realizar o seu intento. Mas, se a possibilidade de se candidatar ao cargo de mais alto magistrado da Nação não passa de uma dessas coisas que dizemos por graça, escrever sobre um Presidente da República é algo a que este lisboeta, estratega de marcas – o nome e conceito Selo.Fan, a loja dedicada à filatelia dos CTT, a que queria conferir o estatuto de bela-arte (a 11ª), são criação sua -, sociólogo e historiador, não é alheio.
Num prazo relâmpago, “um mês e meio”, teve prontas as palavras da Fotobiografia de Jorge Sampaio. O tempo para pesquisar também não foi muito. No Verão passado Vasco estava na praia, com a mulher e a filha, quando recebeu um telefonema do Museu da Presidência da República a convida-lo para integrar o projecto das Fotobiografias de todos os Presidentes, da Fundação da República até ao Presidente ainda em exercício. Aceitou o desafio e mergulhou nos arquivos de Jorge Sampaio e da Presidência da República. Ao contrário do habitual nas fotobiografias, em que os textos complementam as imagens, Vasco optou pelo oposto porque quis criar “um texto analítico e depois ilustrá-lo com imagens”.
Mas procurar as imagens para acompanhar o texto não foi fácil. A preenchida vida profissional do biógrafo e o parco tempo disponível para uma tarefa de tanta responsabilidade obrigaram-no a pedir ajuda na pesquisa de fotografias que ilustrassem os vários períodos da vida de Jorge Sampaio focados. E o pior mesmo foi chegar às fotografias pré-Presidência. Optando por defender o texto e enfrentando as dificuldades da busca de imagens, mesmo nas relacionadas com a Presidência, o resultado final acabou por não ser exactamente o esperado.
Com o texto, e apesar de também não ter sido uma empreitada menos árdua, a situação foi diferente. Baseado essencialmente “nas extensas conversas” mantidas com Jorge Sampaio – fruto de uma franca relação pessoal entre biografo e biografado –, complementadas pelo acesso privilegiado ao arquivo pessoal do Presidente, que “felizmente é uma pessoa que guarda tudo, pelo “óptimo acolhimento e abertura” do Arquivo de Documentação da Presidência e das publicações da Presidência “onde estão a maioria dos discursos e acções políticas do Presidente Sampaio”, o texto cresceu e tomou forma naquelas exíguas seis semanas de 2005. Nos momentos mais angustiantes que um escritor, seja ele de novelas cor-de-rosa ou de biografias de políticos, a preciosa ajuda e a necessária inspiração vieram de Nuno Brederode Santos, cujo apoio foi inestimável.
O conhecimento prévio que Vasco tinha de Jorge Sampaio, quer a nível pessoal, quer profissional, facilitaram-lhe a elaboração da biografia. Não se recorda nem de quando nem onde viu o Presidente pela primeira vez. Calcula que tenha sido em criança, talvez “nos encontros informais que o grupo de Jorge Sampaio promoveu no Alentejo desde sempre, ou então nas campanhas e comícios a que o meu pai me levava”. O pai, João Durão, além de militante do PS há muitos anos, é amigo de longa data e conselheiro informal de Sampaio. Isso, porém, não foi entrave à isenção e ao rigor colocados quer na elaboração do texto quer nos assuntos abordados. De fora das conversas nada ficou, nem nada foi considerado intocável pelo biografado, que nunca deixou nenhuma pergunta sem resposta, até porque Vasco nunca faria “um serviço por medida”, tendo a sua independência sido “garantida desde o início”. No texto final, e apesar de terem sido abordadas nas conversas mantidas, apenas não surgem “algumas questões de ordem pessoal, ou de pormenor” que “necessariamente afectam os políticos” ainda no pleno exercício das suas funções.
O conhecimento próximo e de vários anos que tinha a nível pessoal do Presidente, foi complementado pelo trabalho académico. A tese de Mestrado “Intervenção Socialista” (Livros Horizonte, 2002), aborda a história da Intervenção Socialista, da qual Jorge Sampaio foi um dos membros do núcleo fundador. Associação política cuja vida decorreu entre o pós 25 de Novembro e Fevereiro de 1978 (altura em quase todos os seus membros aderiram ao PS), cujo grupo central era constituído, além de Jorge Sampaio, por João Bénard da Costa, José Manuel Galvão Teles,
João Cravinho, Joaquim Mestre, Armando Trigo de Abreu, César Oliveira, Nuno Brederode Santos e Luís Nunes de Almeida. Apresentando-a como uma “elite política de esquerda” que “marcou presença nos momentos políticos fulcrais do seu tempo, com uma influência maior do que o número reduzido dos seus membros.”, a pesquisa sobre a Intervenção Socialista permitiu-lhe conhecer bem o passado político de Jorge Sampaio e analisar em detalhe um lato período da História Política nacional, incluindo o PREC (Processo Revolucionário em Curso), outro dos seus grandes interesses.
Em comum com Jorge Sampaio, Vasco Durão tem a simplicidade – o título da Fotobiografia é “Um Cidadão Igual a Nós” –, não se achando nem mais nem menos do que os outros, um espírito aberto, o respeito pelos valores solidários e igualitários, pela Liberdade, pela Democracia e pelo espírito do 25 de Abril.
A biografia de fundo de Jorge Sampaio terá que esperar, pois por ora não passa de uma “possibilidade informal”. E porque não é preciso “dar tempo ao tempo para fazer uma coisa a sério sem o fantasma do politicamente correcto”, como Vasco precisa de tempo, escasso na sua vida diária, para si, para os seus gostos (o cinema e a música estão entre as suas paixões de sempre, tanto que saídas nocturnas, regra geral só para ver filmes ou ir a concertos) e para aquilo que este homem de família considera mais precioso: “tempo de qualidade para a minha mulher e a minha filha.”.
* written in early 2006 for Público newspaper but never published.